sábado, 15 de janeiro de 2011

"na fronteira entre felicidade e ceticismo" (a resenha do giusti)

Acho engraçado o pessoal da torcida arco-íris, cujo coro é engrossado pela dor de cotovelo dos gremistas e palmeirenses, dizer que não queria o Ronaldinho Gaúcho nos time deles. Pois eu queria ele no Mengão sim, e se der, dona Patrícia, traga o Kaká e o Messi, por favor. O Flamengo – e o futebol do Rio – precisavam de uma negociação assim.

Mas a verdade é que a chegada do Gaúcho, que se fosse para chamar de gênio sempre achei que merecesse mais do que o seu xará gordinho, me deixa na fronteira entre felicidade e ceticismo. Flamengo, teu passado te condena! Em 95, não havia outro caminho: seríamos campeões cariocas, da Copa do Brasil e paparíamos o Brasileirão no ano do centenário. Depois era só aguardar o gran finale dos sonhos da nação: bi da Libertas, como diz meu chefe no mengo beat, e outro bi, o de Tóquio (na época acho que o Mundial ainda era na terra da Yoko Ono). Dúvidas? Ora, afinal repatriamos o baixinho, esse sim, gênio indiscutível. Pois bem, quando veio a fatura, ‘tava lá discriminado. Com Romário, o Mengão ganhou umas duas ou três taças Guanabara, dois cariocas e uma Mercosul, que era a sul-americana d’antanho, muito pouco para o que se pretendeu. Sem falar que datam desses anos duas das derrotas mais doídas da história rubro-negra: o carioca de 95, com aquele gol de barriga ridículo, e a Copa do Brasil para o Grêmio, em pleno Maraca, quando estávamos com o caneco na mão e deixamos empatar, sendo que Romário minutos antes perdeu um gol feito, porque devia estar com a cabeça na balada de depois do jogo.

O passado assombra porque na Gávea as coisas não mudaram dos anos 90 para cá (ameaçaram, mas não mudaram). Romário foi pro Flamengo para acabar de completar a fortuna que juntou na Europa e para gastar a dinheirama do jeito que mais gostava: na vida mansa do Rio, indo pra noite, jogando futivôlei e de vez em quando pintando lá na Gávea para dar uma força pra rapaziada. E quem ia dizer que que ele não podia?

Não sei se essa é a intenção do Ronaldinho. Como pessoa, me parece melhor do que Romário. Mas a gente sabe que o sujeito se amarra numa bagunça, e sabe também que nem dona Patrícia nem ninguém por lá vai chamá-lo num canto e dizer “meu camarada, vamos levar a sério a grana que você tá ganhando?”.

Não estou interessado em saber o que o jogador faz ou deixa de fazer fora das quatro linhas. Minha preocupação é só que exista alguém fazendo com que ele jogue, decida, resolva, leve a sério. E já que estamos falando de gaúcho, chego a lembrar de uma história do Analista de Bagé, do Luis Fernando Veríssimo. O machista casou com a feminista e na primeira noite ela botou a banca, dizendo que ia fazer e acontecer. Ele concordou com tudo, desde que antes ela fizesse a comida e lavasse a louça.

Arrebenta, Gaúcho.

andré giusti é escritor e jornalista
http://www.andregiusti.com.br/blog/